quinta-feira, 7 de junho de 2012

A declaração de Ronaldo e a falta de profissionalismo de alguns jornalistas portugueses

Penso que o caso que hoje presenciei é paradigmático do buraco em que caiu o jornalismo português. Hoje, durante uma conferência de imprensa na Polónia, um jornalista enviado especial de uma estação de TV portuguesa para acompanhar uma Seleção de futebol, pediu a um responsável da Federação para comentar uma afirmação de Cristiano Ronaldo ao jornal espanhol “A Marca”. E a afirmação, segundo o jornalista, era de que o jogador português apostaria todo o seu dinheiro em Espanha para vencedor do Euro 2012.
Ora, acontece que não foi essa a afirmação de Ronaldo, que disse claramente nessa entrevista apostar em primeiro lugar em Portugal – “Se eu tivesse uma mala cheia de dinheiro, apostaria em Portugal e na Espanha. Não quero ser hipócrita. Sou muito esperançoso, e, depois de Portugal, eu vou na Espanha”. Claro que Ronaldo joga em Espanha e estava a dar uma entrevista a um jornal espanhol, sendo que Espanha é, por acaso, campeão do Mundo e da Europa. À semelhança da questão do jornalista português na conferência de imprensa de hoje, a imprensa portuguesa e os seus vários sites, reproduzem hoje a declaração de Ronaldo, atribuindo-lhe, nos títulos, a intensão de apostar em Espanha.
Já a imprensa brasileira, que também reproduz a mesma declaração de Ronaldo, titula o mesmo conteúdo com mais rigor, dizendo que Ronaldo apostaria em primeiro lugar em Portugal. A fonte é, contudo, sempre a mesma: as declarações de Ronaldo ao jornal “A Marca”.
Pergunto se o jornalista da TV, enviado especial ao Euro, sabe que deontologicamente não deveria ter colocado a pergunta sem ter confirmado a veracidade da declaração de Ronaldo. E pergunto-me se se terá limitado a ler os títulos da reprodução da notícia na imprensa nacional.
É que se assim foi, cometeu um falha profissional grave, demonstrando desconhecimento profundo do que é a sua própria profissão e quais as suas obrigações, reproduzindo o erro dos colegas sem confirmar a declaração. Se, pelo contrário, o mesmo senhor estava consciente das declarações de Ronaldo, então estamos perante pura má fé a que se junta falta de profissionalismo.
O erro no jornalismo e a falta de rigor tornam-se não apenas em falhas graves. São hoje pragas, pois aquilo que era, outrora, a falha humana, normal em todas as profissões, é ampliada e reproduzida, não apenas pelas redes de informação informais, mas já pelos próprios órgãos de informação. E isso só se torna possível porque há pessoas no jornalismo que não fazem a mais pequena ideia das regras que deveriam presidir à sua atividade.

PS: depois da conferência de imprensa na Polónia, alguns jornais e sites vieram corrigir os seus títulos, acrescentando "Portugal" à frase de Ronaldo.

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