terça-feira, 20 de novembro de 2012

Mais uma cartolina para o vídeo de Marcelo

SALÁRIOS REAIS DOS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS SUBIRAM EM PORTUGAL ENQUANTO BAIXAVAM NA ALEMANHA

Dizia a telespetadora de um fórum televisivo que não compreendia por que razão sempre que há crises os “maus da fita” são os funcionários públicos. Ora vejamos se assim é: entre 1985 e 1995, ou seja em apenas 10 anos, os salários dos funcionários públicos quase duplicaram. Nesses 10 anos, nove correspondem à governação de Cavaco Silva, que aumentou os funcionários públicos em 90%. Se tivermos em conta os últimos 30 anos, a subida real dos salários da função pública foi de… 150%. Note-se que estamos a falar do período entre 1978 e 2009, ou seja, já em democracia consolidada e com duas intervenções do FMI pelo meio. E, atenção, este cálculo contém a correção monetária, referindo-se a um “aumento real dos salários” e não nominal. Os números são dados oficiais do Banco de Portugal e foram publicados em 2010.
Mais estranho, na década de 2000 a 2010, passada toda ela com níveis de crescimento diminutos em Portugal, ou mesmo com recessão – e certamente com crise – a subida dos vencimentos reais dos funcionários públicos em Portugal foi de 17%. Nesse período, os funcionários públicos alemães (isto podia estar numa das cartolinas de um lamentável vídeo que por aí andou) perderam 8,3% de salário real.
Só em 2009, ano de eleições e em plena crise internacional e profunda crise da dívida que nos levaria à pedida de ajuda externa, José Sócrates subiu os vencimentos dos funcionários públicos nuns surpreendentes 5%.
Este aumento enorme de salários foi decidido apesar das conclusões de um estudo do Banco de Portugal, então liderado então por Victor Constâncio, que demonstrava que os funcionários públicos não apenas ganhavam muito acima dos seus congéneres privados com funções semelhantes, como essa diferenças vinha galopando (de +50% em 1996 para +75% em 2005). Neste estudo não estavam contabilizadas algumas regalias sociais exclusivas dos funcionários públicos.
Para se ter uma ideia de como se caminhava para o abismo, o setor da saúde viu a sua dotação orçamental crescer entre 2000 e 2010 a uma média anual de 10%, atingindo 100% de crescimento de despesa numa década, sendo o fator salarial um dos que mais pesou.
Mas não foram apenas os salários que cresceram. O número de “beneficiários” também tem estado em crescimento ao longo dos últimos 30 anos. Mesmo em crise. Em Maio de 2010, Victor Constâncio (mais uma vez) desmentiu Sócrates quando este afirmou uma redução do número de funcionários públicos. Mesmo em plena crise, o Governo Socialista continuava a aumentar os “jobs” no Estado e a engordar… a “porca”, como alguém lhe chamou. Havia em Portugal 700 mil funcionários públicos diretos.
A senhora que falou ao fórum televisivo tem todo o seu direito à indignação face à perda de salário no último ano. E tem todo o direito em dizer que os funcionários públicos foram finalmente chamados a pagar a mesma crise que os privados andam a pagar há muitos anos. O que não pode dizer é que os funcionários públicos são sempre os penalizados. Não são. Nunca foram. Era interessante que não apenas percebesse isso mesmo, como também percebesse que essa escalada desproporcionada de salários da função pública é obviamente uma das razões fortes que levaram o país ao estado em que está. Seria também conveniente que nos dissesse se, por acaso, foi eleitora de Cavaco Silva e de José Sócrates, como a maioria dos portugueses (e dos funcionários públicos) terão feito por pelo menos duas vezes.

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