domingo, 29 de abril de 2012

Comissão da Carteira Profissional de Jornalistas, Sindicado dos Jornalistas, Diretores de Informação... o que é isto?

Por razões várias, entre as quais se contam algumas do foro ético, resolvi, há tempos, esquecer um caso de escandalosas violações de quase todo o código deontológico por parte de um jornalista que, na ânsia de fazer negócio fácil em vários campos, envolveu as três estações de televisão nacionais (em particular uma das privadas) numa aventura de inaceitável desrespeito pelos mais elementares direitos e deveres de informação, violando de forma grosseira o dever de pluralismo por razões exclusivamente financeiras.
Hoje, contudo, tenho que dizer qualquer coisa num caso com características semelhantes no qual não tenho qualquer envolvimento profissional, empresarial ou pessoal. Na RTP, canal público, vi uma reportagem sobre ciclismo, onde uma empresa – a PGM – era produtora e onde o jornalista Carlos Raleiras era o repórter.
A PGM tem como cliente o organizador da maioria das provas de ciclismo em Portugal. Carlos Raleiras é jornalista profissional com a carteira 1755, atribuída pela respetiva comissão. Mas, Carlos Raleiras é também sócio da PGM, que é, aliás, uma unipessoal do próprio, dedicando-se à produção de programas para TV e Rádio, sobretudo na área desportiva. À PGM, Carlos Raleiras chama Projectos Globais de Media. E são, de facto, globais...
Carlos Raleiras não é apenas o único sócio da empresa, é também seu próprio funcionário, encarregando-se das propostas comerciais, das negociações com os clientes e da montagem de todo o negócio e operações comerciais e logísticas. Carlos Raleiras assina as propostas comerciais que a sua empresa faz, publicita a sua empresa, assinando a publicidade que lhe faz e negoceia pessoalmente os tempos de exposição mediática que “oferece” aos participantes nas provas de que faz cobertura, em função da “comparticipação” que lhes cobra.
Carlos Raleiras é ainda repórter, pago pela mesma empresa onde é sócio, ao serviço dos seus clientes. A sua PGM, por acordo com os órgãos de comunicação social e no âmbito do contrato que tem com os seus clientes – neste caso, os organizadores das provas de ciclismo em Portugal – entrega depois aos órgãos de comunicação social os programas já montados, onde na ficha técnica aparece como repórter ou jornalista. E onde a sua PGM tem a produção a seu cargo. É frequente trocar os conteúdos que oferece às TV's por "slides" publicitários, que cobra aos seus clientes, depois de ter assegurado ser o único detentor dos direitos televisivos do evento, em acordo comercial com os organizadores da prova.
Este exemplo do que se passa no desporto, repete-se também em áreas económicas, na rádio.
Temos, portanto, à luz do dia, um jornalista, assim identificado, portador de carteira profissional, a agir como jornalista, em proveito comercial da empresa de que é único sócio e dos seus clientes, fazendo reportagem. À luz do dia e nos principais canais de TV e rádio nacionais, envolvendo, além de si, outros jornalistas, profissionais, comentadores e o prestígio (digamos, réstia de decência) que a comunicação social ainda vai tendo.
A pergunta que se impõe é a seguinte: o que será necessário para que a Comissão da Carteira Profissional de Jornalistas, o Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas, diretores de informação, diretores de estação e, vamos lá, para que os seus colegas acabem com esta e outras pouca vergonha?

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