terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Quem é o racista?

Há dias um jogador de futebol acusou outro jogador de futebol de ter feito comentários racistas em campo. Não sei se os fez e acho mesmo que nunca saberemos. Se o fez, acho inaceitável. Mas a questão – que não é nova no futebol – levou-me a meditar sobre o assunto e sobre o que é isso do racismo no futebol. Há dois anos, o Atlético de Madrid foi condenado a jogar à porta fechada durante dois ou três jogos por alegadamente a sua claque ter sido racista, contra um adversário. Disseram os juízes da UEFA que quando um jogador negro jogava à bola, a claque gritava “uuuh, uuuh, uuuh) alegadamente imitando um macaco.
Em primeiro lugar, a analogia ao macaco é de mau gosto. De mau gosto para quem a faz, seja da claque do Atlético de Madrid, seja de quem faz essa interpretação. Se ao ouvirmos “uuuh, uuuh” achamos que isso só pode ser dirigido a um negro, então é porque achamos um negro parecido com um macaco e, logo, os racistas somos nós. Em segundo lugar, o Atlético defendia-se dizendo que o que gritava a claque – havendo ou não negros em campo –, era sempre a mesma coisa: “Kum; Kum; Kum”, referindo-se a Kum Aguero, o seu avançado goleador de então, por acaso branco. A UEFA achou, contudo, que aquele som só poderia ser a imitação de um macaco e, logo, dirigido a um negro (dos vários negros que estavam em campo, alguns eram do Atlético de Madrid).
Levanto, por isso, a questão. O que é isso do racismo e que moral tem a UEFA nesta matéria? Estou farto de ouvir nos estádios portugueses chamar “fdp” aos guarda-redes adversários quando estes batem pontapés de baliza. Questiono-me: se o guarda-redes for negro é racismo? E se for branco, não é? E não sendo racismo, é lícito a uma claque insultar um branco mas é proibido ser for preto? Se a claque for de negros e o jogador branco, para a UEFA é racismo? A UEFA preocupa-se e pune o clube se uma claque de negros fizer qualquer gesto ou som que compare um branco a um animal? No caso Alan, o jogador do Braga acusou Xavi Garcia de lhe ter chamado “preto de merda”. E se Xavi Garcia lhe tivesse chamado “avançado de merda”, seria tolerável? E se Alan tivesse chamado ao jogador do Benfica “espanhol de merda”, seria xenofobia? Ter-se-ia levantado a questão? Sendo provadas estas situações, seriam todas punidas?
Sou frontalmente contra o racismo. Mas sou também frontalmente contra quem, a propósito da luta contra o racismo, se transforma no portador de algo ainda mais perigoso do que o racismo, que é o racismo fundamentalista, não apenas contra pretos, amarelos ou vermelhos, mas também contra brancos e contra a diferença. Ignorar a existência de raças não é respeitar as raças. O racismo é, verdadeiramente, o desrespeito pela raça e pelo direito à diferença. Eliminar a diferença (ou iludi-la) é o mais profundo e perigoso dos racismos, seja fisicamente, como procurou fazer Hitler, seja na consciência inquisitória de quem se acha dono da Justiça suprema, como é normalmente o caso da UEFA. A diferença é boa, é bonita e faz bem à nossa espécie e, logo, a todas as raças. É isso que temos que cultivar e não fingir hipocritamente que o preto é branco e que o branco é preto.
Voltando ao início deste texto e ao jogador que acusou outro jogador de comentários racistas, esse mesmo jogador usa um penteado a que a UEFA não se importaria de chamar “étnico”, com berloques na ponta de tranças de cabelo comprido. Pergunto: por que razão o Cristiano Ronaldo não pode levar um brinco para o campo e o Alan pode levar berloques no cabelo, passíveis de atingir jogadores adversários? Proibi-lo, seria racismo?

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